sábado, 18 de junho de 2011

....hora de abrir arquivos, não de aumentar o sigilo....

 

A vida do Estado não pode ser segredo para o povo, porque a autoridade exerce o poder em seu nome



Antes de aprovar a lei que cria a Comissão da Verdade e abrir finalmente todos os arquivos da ditadura militar, como se impõe, o governo Dilma deu sinais de que pode ceder no sigilo eterno de documentos reservados.

É o que se depreende de entrevista da novíssima ministra de Relações Institucionais e da retirada do pedido de urgência para a votação da lei.

O projeto que tramita no Congresso estipula, por emenda da Câmara, com apoio da base aliada, a possibilidade de uma única prorrogação para documentos de sigilo máximo, de modo que ficassem reservados por não mais do que 50 anos.

No Senado, no entanto, o sigilo eterno pode ser restabelecido.

Pelo que dá conta a imprensa, a defesa do segredo partiu de dois ex-presidentes, Fernando Collor e José Sarney.

Sarney, que é imortal na Academia de Letras e talvez por isso namore a eternidade, repele que o interesse seja esconder atos de seu próprio governo: são os documentos antigos que podem causar constrangimento e abrir feridas, diz o senador.

Mas se aprovada a lei, tal como se pretende, o que garantirá o sigilo eterno não é a idade do documento, mas a consideração de sua necessidade por ato do próprio Executivo.

Imagina-se o que um presidente expelido do poder por improbidade pode querer considerar de conhecimento proibido para todo o sempre.

Os episódios que envolveram o ministro Palocci são ilustrativos quanto à natureza do sigilo na vida democrática e permitem que se aprenda com os erros.

Palocci caiu pela primeira vez em razão da denúncia de quebra do sigilo de um cidadão; na segunda, por manter o sigilo acerca de seu próprio e repentino enriquecimento.

A questão central é que a sociedade repele a violação do sigilo do indivíduo pelo Estado, mas compreende quando este se dirige ao conhecimento das entranhas do poder.

A explicação é simples: a vida do povo deve ser segredo para o Estado, mas a vida do Estado não pode ser segredo para o povo. Afinal, a autoridade só exerce o poder em seu nome.

A democracia não se constrói sobre a ideia de sigilo, por que os atos dos governantes devem ser frequentemente legitimados por seus cidadãos. E não existe democracia onde se firma a censura, ou a proibição do conhecimento.

Se já é um despropósito que depois de 21 anos de eleições diretas, ainda nos seja vedado conhecer toda a verdade sobre a ditadura, que dirá pensar em manter outros arquivos em sigilo para toda a eternidade.

A hora é de abrir a verdade, não de aumentar os segredos.

Nem mesmo a higidez das relações internacionais pode explicar a manutenção de sigilos para toda a vida - documentos abertos do governo norte-americano já puderam explicitar o apoio dos EUA aos golpes na América Latina, por exemplo, sem que tenham ficado estremecidas quaisquer relações diplomáticas.

Compreender a história é essencial para um povo determinar os caminhos de seu futuro.

Em tempos de explosão da privacidade e de tantos e quantos vazamentos cibernéticos, ademais, não é preciso muito para entender que a ideia de sigilo eterno está na contramão da história.

Quanto mais os documentos são escondidos, mais se aguça a busca pelo conhecimento por vias transversas, facilitando a vida dos despachantes do segredo. E quem conhece a verdade por meios escusos, tem a seu favor a possibilidade de divulgá-los apenas no que lhe interessa.

Contraditoriamente à ideia de sigilo eterno, milhões e milhões de reais são gastos todos os anos em propagandas de ações governamentais, sem qualquer interesse relevante, que não seja o de alimentar a confiança de eleitores nos próprios administradores.

Nenhum dos governos ou partidos se salva desses enormes desperdícios, que acabam por impedir que se invista em áreas críticas como habitação, saúde ou até mesmo um salário menos imoral a nossos bombeiros.

É preciso entender que, na democracia, o cidadão é um sujeito de direito à informação, não apenas um objeto da publicidade

O Brasil é mais Leila Diniz (O STF e a Marcha da Maconha)

Leila Diniz morreu há 39 anos, em 14 de junho de 1972, com 27 anos de idade, e em seu curto e fértil tempo de vida, fez revolução. Desafiou o que na época se chamava “a moral e os bons costumes”. Leila para sempre Diniz, como disse Carlos Drummond de Andrade, não tinha meias medidas, nem meias palavras, punha a boca no trombone e exercia com alegria seu direito de se expressar livremente.

Ela não foi torturada ou presa por isso, mas recebeu um cala-boca da censura e respondeu a vários processos judiciais. Leila Diniz, por certo, gostaria de estar aqui hoje, neste momento em que o Supremo Tribunal Federal cumpre seu papel maior de garantidor das regras constitucionais e decide que sim, que qualquer cidadão tem o direito de se expressar publicamente, através de manifestações coletivas e pacíficas em defesa de suas ideias e seus desejos.

A conhecida “Marcha da Maconha” vinha sofrendo, aqui e acolá, Brasil afora, enorme resistência do Estado policial e do Poder Judiciário, sendo ela interpretada como incitamento ao uso de entorpecente ou como apologia ao crime. Nada disso. Dizer que sou a favor ou contra, discutir o problema de saúde pública e da violência que estão vinculadas ao comércio ilícito da droga, nada mais é do que direito do cidadão que vota, que paga seus impostos e que pensa, reflete e quer discutir suas questões mais prementes.

A violência que tanto magoa a sociedade atual e que tanto se quer reprimir e solucionar está na raiz da discussão sobre a questão das drogas. Quem tem medo da conversa, do diálogo, do pensamento plural? Quem tiver, que se cale agora, pois quem tinha que dizer o direito, o fez.

O STF julgou por unanimidade ação promovida pela Procuradoria Geral da República, na qual se pleiteou interpretação da lei penal de modo a não impedir a realização de manifestações públicas em defesa da legalização de drogas. E o STF entendeu que defender a legalização das drogas não é fazer apologia a um fato criminoso. E, os Ministros foram unânimes em destacar a relevância do direito à livre manifestação do pensamento.

Falar sobre políticas de droga, querer discutir e mudar as leis não é ato criminoso, não é incitamento ao consumo de droga. O Ministro Celso de Mello, em belíssimo voto, ponderou que “o debate sobre abolição penal de determinadas condutas puníveis pode ser realizado de forma racional, com respeito entre interlocutores, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa”.

E a Ministra Carmem Lucia Antunes Rocha, por seu lado, festejou o direito de se fazer manifestações públicas e lembrou a fala de um jurista americano que disse que “se, em nome da segurança, abrirmos mão da liberdade, amanhã não teremos nem liberdade e nem segurança”.

É isso ai! E podemos comemorar: o Brasil, hoje, está mais Leila Diniz

....o medo do juiz diante do réu.... (Blog do Marcelo Semer)





 



Minha intranquilidade cresceu e com ela a vontade de terminar logo a audiência

Da série, "Crônicas do Crime": O medo do juiz diante do réu



Ainda estava no começo da carreira, quando fiz a audiência de Júlio.
Lá se vão mais de vinte anos e a imagem não me sai da cabeça. O bom é que isso hoje me ajuda a perguntar primeiro, antes de suspeitar; e suspeitar primeiro antes de ter certeza...
Júlio estava sentado na cadeira do réu, bem na ponta da mesa de audiências. Eu, no centro da mesa superior, que fica sobre um espaldar acarpetado, fazendo um T com aquela mesa em que se sentam as outras pessoas.
Dizem que a mesa do juiz está no tablado elevado para que as partes possam fiscalizar melhor os trabalhos da Justiça. Mas muitos colegas acreditam demais na superioridade aparente destes quinze centímetros. Maior o tombo, em algum momento da carreira.
Ouvi a primeira testemunha e tudo transcorria na maior tranquilidade. O próprio Júlio já tinha sido ouvido antes, para explicar a briga no bar em que se envolvera.
Veio, então, a vítima e depois o dono do bar, que narraram a agressão que ele, já embriagado e a altas horas da noite, praticou, depois de quebrar um copo no balcão. A vítima saiu-se com ferimentos leves no braço.
Quando ouvíamos a última testemunha, o policial militar chamado depois da briga, começo a ouvir Júlio resmungar.
A princípio, penso que murmura com seu advogado e procuro me concentrar no policial.
Aumenta o som e meus olhos se viram para o réu. O advogado interfere rapidamente e fala em nome dele.
-Excelência, o senhor podia arrumar um pouco de água para meu cliente?
Respiro fundo e mando o escrevente interromper a datilografia do depoimento para buscar água.
Voltamos à testemunha e os resmungos continuam. Mais altos agora.
Faço cara feia para o advogado, em busca de uma explicação, quando me deparo com uma cena que acende a luz de emergência. Júlio, além de murmurar, segura forte e balança o copo nas mãos.
O copo!
O escrevente deu ao réu um copo de vidro –mais ou menos como aquele que Júlio é acusado de ter quebrado na mesa do bar e depois usado para ferir seu amigo. Agora está ele ali, perdendo o controle novamente, a poucos centímetros da cadeira do promotor.
E com um copo, o copo, nas mãos.
Minha intranquilidade cresceu e com ela a vontade de terminar logo a audiência.
Fico entre mandar que Júlio se cale e exigir a devolução do copo. Haverá reação? Na dúvida, opto por esperar, porque tudo está quase acabando.
Mas é justamente nesse momento que meu coração se acelera. Júlio solta um grito, uma cara de revolta, e bate o copo fortemente na mesa.
É o que basta.
Ordeno ao escrevente que saia imediatamente para chamar um policial.
-Doutor -falo tão firme quando consigo- vou mandar prender seu réu se ele fizer mais um único gesto.
O advogado, atônito, tenta me dizer algo, mas estanca sem palavras. Hesita entre argumentar comigo e segurar Júlio que, em um movimento brusco, joga a cadeira para trás e se levanta, derrubando o copo no chão.
O escrevente não chega a tempo com o policial e em altos brados, eu decreto a prisão do acusado que, a essa altura, completamente desesperado solta um grito ainda mais potente.
O advogado se agarra a ele e assim que o policial adentra a sala com a mão no coldre, só tem tempo para me dizer em pânico:
-Doutor! É um ataque, é um ataque doutor.
Fomos salvo pelo policial que desbarata a tempo a armadilha que me apavora e me constrange.
Era mesmo um ataque. Epilético.
Guardei a voz de prisão e a suspeita de que Júlio fosse agredir alguém com o copo, cujos cacos só ameaçam a ele mesmo, quando se esparrama pelo chão.
Quinze minutos se passam até que os corações paulatinamente se desaceleram. Acho que
o meu demorou mais do que o de Júlio para voltar ao normal.
Depois de ter sido seguro pelo policial, no corpo para não se bater, na boca para não se morder, Júlio se recupera.
Vagarosamente, senta-se de novo na cadeira dos réus. De cabeça baixa, com uma voz cortada e embargada, cheio de medo e de respeito, fala escolhendo as palavras:
-Doutor, peço que me desculpe. É que eu fiquei muito nervoso com a situação. Estou envergonhado.
Eu também.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

....atitude suspeita....

                                                       Ele era negro, né...




Da série Crônicas do Crime - Atitude Suspeita




Uma coisa que eu sempre tive curiosidade de entender é a “atitude suspeita”, o que
leva policiais em patrulhamento a abordar certas pessoas, e não outras.

Quando ouvimos os relatos no Fórum, temos a nítida impressão de que eles sempre acertam –afinal, se virou um processo, a atitude era mesmo suspeita.

Não levamos em conta, lógico, todo aquele contingente de pessoas vigiadas, abordadas, revistadas que não resulta em prisão nem em processo.

Muitas vezes eu pergunto aos policiais: mas qual era a atitude suspeita?

As respostas são as mais diversas e até contraditórias.

O sujeito estava andando em uma direção e passou a andar em outra. Ele estava parado e, então, começou a andar, ao vir a viatura. Quando nós passamos, ficou completamente parado e não saiu do lugar.

A reação facial também é determinante da suspeita: seus olhos mostravam nervosismo, quando nos viu. Ele abaixou a cabeça quando olhamos para ele. Fingiu que não era com ele e continuou olhando para outro lado. O rapaz me encarou de frente, doutor, quando o encarei. E por aí vai.

O medo parece ser o principal combustível da suspeita, segundo o tão comentado “tirocínio policial”. Mas será que em certas situações, o medo não é provocado pelo próprio tirocínio?

Marcos Roberto não foi abordado por um policial. Mas por um agente de segurança ferroviário. Algo como um ‘policial’ da companhia de trens. Talvez sem o mesmo tirocínio. Talvez exatamente com ele.

Foi no mesmo contexto em que Suzana, uma mulher de trinta, se tanto, foi encontrada com uma porção de cocaína do tamanho de uma bola de tênis dentro de sua bolsa.

Eu não consegui saber se Suzana e Marcos se conheciam. Os agentes ferroviários também não.

Suzana entrou em um vagão de trem. Os agentes entraram atrás. Antes que o trem desembarcasse, ela mudou de vagão, despertando a suspeita dos seguranças e disparando o alarme do tirocínio.

Na estação seguinte, os agentes mudam de vagão e encontram Suzana sentada. Encaram-na e recebem como resposta um abaixar de olhos. O comportamento estranho de trocar de vagão, o medo no olhar e pronto, a decisão de abordá-la estava tomada. Na revista da bolsa, bingo, a droga, que ela afirmava portar para uso pessoal.

Mas o leitor pode estar se perguntando a essa altura: e Marcos Roberto, o que tem a ver com isso?

Foi exatamente o que eu perguntei.

Marcos não estava conversando com Suzana.

Não estavam sentados juntos.

Não estavam se olhando, enquanto o trem andava.

Abordado com os olhos, Marcos Roberto não abaixou a cabeça. Encarou os agentes, assim, como quem não tem medo nem nada a dever.

Por que, então, a atenção dos seguranças?

-Bom, doutor, começou um dos agentes, ele era negro, né, ..?

Diante do olhar estupefato de todos nós e depois de um constrangedor minuto de silêncio, o segurança emendou com explicações desencontradas:

-Estava no vagão, estava meio próximo dela assim, o senhor sabe como é, pareceu intranquilo, olha, doutor, mesmo se fosse branco...

O outro agente, mais discreto ou mais precavido talvez, disse que o que chamou mesmo a atenção da segurança foi o fato dele estar ... suando.

Marcos Roberto foi abordado, revistado e, depois de descoberto que já tinha passagens pela polícia, encaminhado à delegacia, de onde foi finalmente liberado.

Até uma próxima abordagem, onde continue despertando “suspeitas”...
STF se prepara para julgar interrupção da gravidez de feto anencefálico

Uma das gestações mais longas do STF está para ter fim.

O ministro Marco Aurélio disponibilizou para julgamento a ADPF 54, que aguarda a bagatela de sete anos para ser analisada pelos ministros de nossa Corte Suprema.

Trata-se da autorização de interrupção da gravidez do feto anencefálico.

O processo se iniciou em 2004, quando a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) ajuizou ação no STF pretendendo unificar a interpretação judicial nos casos em que se descobre que o feto nascerá sem cérebro.

Houve concessão da liminar pelo ministro Marco Aurélio, mas a decisão foi cassada no mesmo ano, pela maioria do Plenário. Mais de vinte instituições foram ouvidas em audiência pública.

De 2004 para cá, a composição do STF se alterou, havendo nos meios jurídicos a expectativa do julgamento de procedência da ação: em outras palavras, que o tribunal repute como legal a autorização judicial para a interrupção da gravidez nestas hipóteses.

Na maioria dos casos, tal autorização já vem sendo concedida por juízes e tribunais estaduais, com base em dois bons argumentos.

O primeiro é que em se tratando de anencefalia, não há propriamente aborto. O aborto pressupõe expectativa de vida, o que não ocorre quando há ausência de cérebro. Fazendo um paralelismo com a lei que autoriza a doação de órgãos, o diagnóstico de morte encefálica já caracteriza legalmente a situação post mortem, exigida para a retirada dos tecidos.

Os juízes também tem se ancorado no princípio da dignidade humana. Seria uma ofensa à dignidade, exigir de uma mãe que suportasse por nove meses a gestação de um filho que nascerá sem cérebro e, portanto, sem vida. Tem-se entendido que o Estado não pode impor tal sofrimento à gestante.

De outro lado, há quem defenda a proibição da conduta pela ausência de regra no Código Penal que a autorize. Como se sabe, nossa lei criminaliza o aborto, punindo tanto o médico ou a parteira que o realizam, quanto a gestante que o autoriza, com apenas duas exceções: gestação resultado de violência sexual e aquela que põe em risco a vida da mulher.

Mas existe uma circunstância que milita em prol dos defensores da autorização judicial: o Código Penal de 1940 não podia estipular a legalidade desta interrupção, pois não era imaginável quando editado, que a medicina pudesse prever a má formação fetal com tamanha antecedência.

E para os que se aferram na letra fria da lei, ou no caso, da ausência dela, uma lição de recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que enfrentou a questão e autorizou a interrupção da gravidez: É a vida que faz o direito, não o direito que faz a vida.

A falta de uma norma específica, portanto, não poderia ser álibi para a não aplicação de um princípio tão fundamental quanto o da dignidade da pessoa humana. E a jurisprudência do STF cada vez mais se distancia dos primados do positivismo, inclusive para reconhecer que nem todo direito está contido na lei. Isto seria legalismo, não justiça.

A rigor, não se tratando propriamente de aborto, eis que o feto não tem perspectiva de vida diante da prenunciada ausência cerebral, nem mesmo a autorização judicial seria necessária.

Afinal, não cabe aos juízes criminais autorizar a prática de um ato legal. Todavia, a reticência dos médicos acabou por trazer a questão aos tribunais -por sorte, juízes das instâncias inferiores não estão demorando o mesmo tempo dos ministros para avaliarem tais casos.

O STF deve, sobretudo, fugir à tentação de se embrenhar na questão religiosa, resistindo à forte pressão das Igrejas quando assuntos como esses chegam às pautas, seja do Congresso, seja dos tribunais.

Sem desmerecer ou menoscabar os fundamentos e o direito dos religiosos de expô-los, certo é que os princípios morais tutelados pelos diversos credos só dizem respeito a seus próprios fiéis e, diante da centenária separação Igreja-Estado, não podem ser impostos ao conjunto dos cidadãos.

No âmbito político, a potência dos lobbies religiosos tem demonstrado força incomum.

Aparentemente, com o julgamento da união homoafetiva, o STF afastou os riscos de violação do Estado laico e nada indica que venha a ceder neste novo julgamento.

É ver pra crer.

Por: Marcelo Semer

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Um caso que não está encerrado


Diz a presidente da República que o “caso” Palocci está encerrado.

Trata-se de uma afirmativa autoritária que passa por cima de instituições do Estado, às quais cabe zelar pela moralidade administrativa; sobretudo, ao Ministério Público.

É verdade que o Ministério Público já está buscando procrastinar a questão, afirmando que necessita, para atuar, de elementos que ainda não lhes vieram às mãos.

Nota-se que estamos no momento em que o mandato do Procurador Geral da República está por esgotar-se, demandando um novo período de dois anos. É claro que, esquecendo-se da relevância de suas atribuições, pois a chefia do Ministério Público proporciona a seu titular poder e prestígio, uma vez que a instituição se qualifica hoje com as condições de verdadeiro poder de Estado, o chamado “quinto poder”. É ao Ministério Público que compete, nos termos do artigo 127, da Constituição Federal, “a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

Como a chefia do Ministério Público Federal é de livre escolha do Presidente da República, é de uma normalidade que é quase uma anormalidade, o empenho dos titulares em exercício em permanecer por novo período na chefia do “parquet”. E, para tanto, precisam demonstrar sua subserviência àquele ao qual deve sua designação, para alcançar mais dois anos de mandato.

Poucos foram aqueles que não se deixaram submeter ao poder maior, para permanecer no cargo.

Ora, dizer que faltam elementos para um exame conclusivo do “caso Palocci” é deixar de cumprir com o seu dever.

O Ministério Público não pode alegar, para fundamentar o “non possum”, que lhes faltam elementos, pois se lhes faltam, que os requisitem, como permite a lei e é de suas obrigações funcionais.

O problema real é que não devem e não podem exercer cargos de confiança tantos quantos estão submetidos a processo penal, como é o caso, pelo menos de dois ministros de Dilma, um deles Palocci, que responde a processo penal, pela sua intervenção na atitude do caseiro, guarda de uma mansão em Brasília.

O presidente da República deve ser o guardião da moralidade pública, requerida pela Constituição, para o exercício do poder.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Noticias do ensino jurídico


Têmis (quando os homens ainda não tinham vendado seus olhos).
Escultura datada de 300 aC, atualmente no Meseu Arquelógico Nacional de Atenas.


Prezado professor ou doutor (ou os dois) Gerivaldo Neiva,

Antes de mais nada, gostaria de parabenizá-lo e agradecer-lhe. Chamo-me Gean, e escrevo de uma cidadezinha chamada São José dos Quatro Marcos, localizada a 315km de Cuiabá, capital de Mato Grosso, e curso o quinto semestre de Direito na Universidade do Estado de Mato Grosso, campus universitário de Cáceres/MT. Desde antes do início do curso, em 2008, muitas inquietações permeavam a minha cabeça sobre o Direito e as questões afins. Acho que isso é algo até natural, já que a cabeça de um estudante de ensino fundamental, no alto de seus dezesseis anos, precisava buscar solução para seus conflitos internos e, por isso, encontrei seu blog.
Aliás, além de encontrar seu blog, encontrei a sentença “O celular do carpinteiro” e me rendi aos encantos desta diferente visão sobre o Direito. Essa visão constitucionalizada do Direito e da Justiça, que, aliás, deveria ser obrigatória a todos os “operadores” do Direito, é fantástica e escassa. E é por isso, portanto, que gostaria de agradecer-lhe e parabenizá-lo: por ser um espelho a uma gama de acadêmicos que pretendem, incansavelmente, perseguir a Justiça.
Mas, na realidade, não é este o motivo do e-mail que ora escrevo. Conforme mencionei, venho acompanhando seus escritos ao longo do tempo e percebo esta sensibilidade em analisar os fatos, não com a frieza que muitos insistem em adotar. E percebo, ainda, que, nestes mesmos escritos, o senhor vem mencionando uma série de autores que compartilham desta sua opinião. Daí, as tais inquietações a serem abordadas.
Não sei se a realidade baiana não é a mesma que a mato-grossense, mas o estudo acadêmico é pouco. Diria até insuficiente. Às vezes hoje, já no quinto semestre, sinto necessidade de aprofundamento nesta teoria. E, infelizmente, isso não ocorre aqui. Aliás, ocorrer até ocorre, mas os professores acabam por se tornar quase “extraterrestres”, que insistem em se distanciar cada vez mais dos acadêmicos. Uma das poucas vezes que a academia nos fez pensar foi quando dividiram nossa turma em grupos e, a partir disso, distribuíram casos difíceis, os hard cases, para serem solucionados, como se cada grupo fosse realmente uma corte constitucional de um país imaginário. Somente nesta ocasião é que vimos o sentido de o símbolo do Direito ser uma balança.
Depois, tentamos nos aprofundar na seara dos teóricos, estudando Ronald Dworkin e tentando debater suas teorias, isto já no quarto semestre. Veja só, após dois anos de faculdade, os professores vêm nos propor estes assuntos e esperam que saibamos discorrer sobre eles de forma natural. Para a minha mente de acadêmico isto seria quase impossível, já que passados estes dois anos nunca fomos incitados a nada do tipo.
É por isso que gostei do seu espaço virtual: alguém aparentemente “normal” (rs), que procura esclarecer as coisas da forma como pensa, que tem nexo em suas alegações e que é humano. Que não renega ou critica ou até mesmo ri da religião e da moral de cada um. Que discorda da opinião alheia, mas tem bons fundamentos para fazê-lo e não desfaz nenhum discurso de forma grosseira.
Receio que seu tempo seja corrido, que tem lá sua profissão, que por sinal é o sonho de muita gente, e que não tem muito tempo a disponibilizar para esta leitura alternativa de e-mails, até porque também acompanho sua agenda no rodapé de seu blog. Mas, ainda assim, gostaria de pedir-lhe algo um tanto quanto audacioso (rs). Daqui a dois anos e meio espero concluir meu bacharelado e serei jogado no “mercado de trabalho”, simplesmente com um diploma que não atesta realmente quem sou no âmbito profissional. Então, gostaria de pedir-lhe uma luz: começar a “engolir” teoria vai me fazer ser uma cabeça pensante? Preciso arrumar um tema de monografia, mas a minha faculdade é restrita à sua própria circunscrição: é possível que de lá saiam cabeças pensantes, buscando guarida em outros professores e doutores?
Então, já vi em seu blog uma série de doutrinadores renomados, que defendem ferrenhamente a Constituição e admiro muito isso. Gostaria até, se fosse possível, que eu desenvolvesse algum trabalho “de campo” nesta minha universidade, já que ela fica restrita tão somente aos seus muros e suas praças, não tendo contato direto com a população carente que permeia os bairros pobres da cidade e que às vezes precisa de instrução, em vez de consulta ou assistência, como muitos dizem, para resolver por si mesmos seus conflitos.
É isso. Foi mais um desabafo para alguém que, ao menos aparentemente, sabe ouvir e emitir um parecer respeitoso e respeitador. Novamente, obrigado por ter contribuído, mesmo que involuntariamente, para a formação deste neófito que busca constantemente o sentido de estar fazendo Direito.
Quem sabe num dia, não muito distante, possamos ter o prazer de ouvi-lo contar seus causos e suas crônicas aqui, em Cáceres/MT, para esse bando de acadêmicos que anseiam mudanças.

Grande abraço!
Gean Carlos Balduíno Júnior.



Notícias Do Brasil (Os Pássaros Trazem)

Milton Nascimento/Fernando Brant
Interpretação fantástica de Ney Matogrosso

Uma notícia está chegando lá do Maranhão.
Não deu no rádio, no jornal ou na televisão.
Veio no vento que soprava lá no litoral
de Fortaleza, de Recife e de Natal.
A boa nova foi ouvida em Belém, Manaus,
João Pessoa, Teresina e Aracaju
e lá do norte foi descendo pro Brasil Central
Chegou em Minas, já bateu bem lá no sul!

Aqui vive um povo que merece mais respeito!
Sabe, belo é o povo como é belo todo amor.
Aqui vive um povo que é mar e que é rio,
E seu destino é um dia se juntar.
O canto mais belo será sempre mais sincero.
Sabe, tudo quanto é belo será sempre de espantar.
Aqui vive um povo que cultiva a qualidade,
ser mais sábio que quem o quer governar!

A novidade é que o Brasil não é só litoral!
É muito mais, é muito mais que qualquer zona sul.
Tem gente boa espalhada por esse Brasil,
que vai fazer desse lugar um bom país!
Uma notícia está chegando lá do interior.
Não deu no rádio, no jornal ou na televisão.
Ficar de frente para o mar, de costas pro Brasil,
não vai fazer desse lugar um bom país!

CHORO A TUA AUSÊNCIA

Desculpem a ausencia, e a falta de atualizaação do blog, mas falta tempo e dinheiro, pra pagar a mensalidade da internê.!!!!

STF reabre ação encerrada há mais de 20 anos

O Supremo Tribunal Federal (STF) permitiu a reabertura de um caso de investigação de paternidade encerrado há mais de 20 anos por falta de provas. O motivo foi um novo pedido de exame de DNA, com base em uma lei que obriga o Distrito Federal a pagar esses testes quando o autor não tem condições de arcar com os custos.
Um estudante de direito, atualmente com 29 anos, entrou na Justiça pela primeira vez em 1989, por intermédio de sua mãe, pedindo o reconhecimento do suposto pai. Na época, ele era beneficiado pela Justiça gratuita, mas, segundo alegou na ação, o Estado se recusou a pagar o exame de DNA. Como sua mãe também não tinha condições de arcar com os custos, o teste não chegou a ser feito, segundo argumentou a defesa no processo. Por falta de provas, a 3ª Vara de Família de Brasília julgou a ação improcedente na época.
Mas, em 1996, uma lei local obrigou o Distrito Federal a custear exames de DNA quando os autores dos processos não puderem arcar com eles. Assim, o estudante decidiu entrar com uma nova ação na 6ª Vara de Família de Brasília.
O juiz de primeira instância aceitou o processo e determinou a realização do exame de DNA. O suposto pai recorreu ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) argumentando que o pedido violava o princípio da coisa julgada - pois a primeira ação já havia transitado em julgado, ou seja, não cabia mais recurso.
Segundo o princípio da coisa julgada, uma decisão final do Judiciário tem força legal e não pode voltar a ser discutida - o objetivo é garantir segurança jurídica e estabilidade social. O TJ-DF acatou a tese e extinguiu o processo. O estudante, então, recorreu ao Supremo, sustentando que o direito à dignidade humana e de saber quem é o pai biológico se sobrepõe ao princípio da coisa julgada.
Ao analisar o caso ontem, o Supremo entendeu, por maioria, que é possível a chamada “flexibilização da coisa julgada” para garantir o cumprimento de direitos fundamentais, como o de saber a própria origem biológica. O relator do caso foi o ministro Dias Toffoli, que apresentou seu voto em abril. Ao retomar o caso ontem, a maioria dos ministros seguiu o entendimento de Toffoli, a não ser por Marco Aurélio e o presidente da Corte, Cezar Peluso, que foram vencidos. Para eles, flexibilizar a “coisa julgada” traz uma situação de insegurança jurídica, e poderia resultar em diversas ações semelhantes. “Se não houver certeza sobre essa situação em que as partes se envolveram, é impossível viver tranquilo, e não viver tranquilo é não viver na verdade”, afirmou Peluso. Ele também afirmou que, mesmo com a nova ação, o suposto pai poderia se recusar a fazer o exame.
O advogado do estudante de direito, Arthur Regis, argumenta que a recusa em fazer o exame implicaria a presunção de paternidade - um mecanismo que não estava presente na legislação brasileira na época da primeira ação, tendo sido inserido no novo Código Civil, de 2003. O advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), comemorou a decisão. “Para o Supremo, o que deve prevalecer no direito é sua essência, e não sua formalidade.”
Autor(es): Maíra Magro | De Brasília
Valor Econômico - 03/06/2011