segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Estatuto dos Homens (Thiago de Mello)

Art.1º Fica decretado que agora vale a verdade. Agora vale a vida e de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira.
Art.2º Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive que as terças-feiras mais cinzentas, tem direito em converter-se em manhãs de domingo.
Art. 3º Fica decretado que a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra; e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, abertas para o verde onde cresce a esperança.
Art.4º Fica decretado que o homem nunca mais precisará duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.
Parágrafo Único: O homem confiará no homem como um menino confia em outro menino.
Art. 5º Fica decretado que os homens ficarão livres do jugo da mentira. Nunca mais será preciso usar a couraça do silencio nem a armadura da palavra. O homem se sentará a mesa com seu olhar limpo, porque a verdade passará à ser servida antes da sobremesa.
Art. 6º Fica estabelecida, durante dez séculos, a prática sonhada pelo profeta Isaias, e o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de antes terá o mesmo gosto de aurora.
Art. 7º Por decreto irrevogável, fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraldada na alma do povo.
Art. 8º Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que a água que dá à planta o milagre da flor.
Art. 9º Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor. Mas que sobretudo tenha sempre o doce sabor da ternura.
Art. 10º Fica permitido a qualquer pessoa, a qualquer hora do dia, o uso do traje branco.
Art.11 Fica decretado por definição que o homem é um animal que ama e por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã.
Art.12 Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido. Inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar com uma imensa begônia na lapela.
Parágrafo Único: Só uma coisa fica proibida; amar sem amor.
Art. 13 Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o sol das manhãs vindouras. Expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de cantar e a festa do dia que chegou.
Artigo Final. Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente, como um fogo ou um rio, e a sua morada sempre será o coração do homem.

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