sexta-feira, 3 de junho de 2011

STF reabre ação encerrada há mais de 20 anos

O Supremo Tribunal Federal (STF) permitiu a reabertura de um caso de investigação de paternidade encerrado há mais de 20 anos por falta de provas. O motivo foi um novo pedido de exame de DNA, com base em uma lei que obriga o Distrito Federal a pagar esses testes quando o autor não tem condições de arcar com os custos.
Um estudante de direito, atualmente com 29 anos, entrou na Justiça pela primeira vez em 1989, por intermédio de sua mãe, pedindo o reconhecimento do suposto pai. Na época, ele era beneficiado pela Justiça gratuita, mas, segundo alegou na ação, o Estado se recusou a pagar o exame de DNA. Como sua mãe também não tinha condições de arcar com os custos, o teste não chegou a ser feito, segundo argumentou a defesa no processo. Por falta de provas, a 3ª Vara de Família de Brasília julgou a ação improcedente na época.
Mas, em 1996, uma lei local obrigou o Distrito Federal a custear exames de DNA quando os autores dos processos não puderem arcar com eles. Assim, o estudante decidiu entrar com uma nova ação na 6ª Vara de Família de Brasília.
O juiz de primeira instância aceitou o processo e determinou a realização do exame de DNA. O suposto pai recorreu ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) argumentando que o pedido violava o princípio da coisa julgada - pois a primeira ação já havia transitado em julgado, ou seja, não cabia mais recurso.
Segundo o princípio da coisa julgada, uma decisão final do Judiciário tem força legal e não pode voltar a ser discutida - o objetivo é garantir segurança jurídica e estabilidade social. O TJ-DF acatou a tese e extinguiu o processo. O estudante, então, recorreu ao Supremo, sustentando que o direito à dignidade humana e de saber quem é o pai biológico se sobrepõe ao princípio da coisa julgada.
Ao analisar o caso ontem, o Supremo entendeu, por maioria, que é possível a chamada “flexibilização da coisa julgada” para garantir o cumprimento de direitos fundamentais, como o de saber a própria origem biológica. O relator do caso foi o ministro Dias Toffoli, que apresentou seu voto em abril. Ao retomar o caso ontem, a maioria dos ministros seguiu o entendimento de Toffoli, a não ser por Marco Aurélio e o presidente da Corte, Cezar Peluso, que foram vencidos. Para eles, flexibilizar a “coisa julgada” traz uma situação de insegurança jurídica, e poderia resultar em diversas ações semelhantes. “Se não houver certeza sobre essa situação em que as partes se envolveram, é impossível viver tranquilo, e não viver tranquilo é não viver na verdade”, afirmou Peluso. Ele também afirmou que, mesmo com a nova ação, o suposto pai poderia se recusar a fazer o exame.
O advogado do estudante de direito, Arthur Regis, argumenta que a recusa em fazer o exame implicaria a presunção de paternidade - um mecanismo que não estava presente na legislação brasileira na época da primeira ação, tendo sido inserido no novo Código Civil, de 2003. O advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), comemorou a decisão. “Para o Supremo, o que deve prevalecer no direito é sua essência, e não sua formalidade.”
Autor(es): Maíra Magro | De Brasília
Valor Econômico - 03/06/2011

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