sábado, 23 de abril de 2011

Da Série Paradoxos Penais



Legisnaldo é um estudante de direito e está guiando seu carro. Imprudentemente, conversa ao telefone celular. Termina perdendo o controle do carro, subindo a calçada e atropelando um pedestre. A vítima, um senhor aparentando uns 50 anos, que sofreu apenas lesões leves – alguns poucos arranhões –, depois do susto, levanta-se e, nervoso, começa a gritar e a insultar o jovem e infeliz condutor. Testemunhas que assistiram ao atropelamento se juntam no xingamento do rapaz.
Naquele momento, passava perto uma viatura da polícia militar que, imediatamente, aborda o jovem:
- Carteira e documento do carro.
O universitário, já nervoso, entrega os documentos. E o policial, com o boletim de acidente na prancheta, inicia o procedimento de lavratura do flagrante:
- Quer dizer que o senhor sem querer subiu a calçada e atropelou este senhor aqui, confirma? 

- Um momento - pediu Legisnaldo, ainda dentro do carro.
Cuidadoso, o acadêmico de direito pega o seu vade-mecum e começa a estudar os dois tipos penais possíveis. Vai primeiramente ao Código de Trânsito (Lei nº 9.503/97):
 

"Art. 303. Praticar lesão corporal CULPOSA na direção de veículo automotor:
Penas - detenção, de SEIS MESES A DOIS ANOS e SUSPENSÃO ou proibição de se obter a permissão ou a HABILITAÇÃO para dirigir veículo automotor.
Parágrafo único. AUMENTA-SE a pena de UM TERÇO À METADE, se ocorrer qualquer das hipóteses do parágrafo único do artigo anterior.
Art. 302. (...)
Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:
(...)
II - praticá-lo em faixa de pedestres ou NA CALÇADA;"
 

Depois, dá uma conferida no Código Penal, que versa sobre a lesão corporal leve dolosa:

"Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Pena - detenção, de 3 MESES A 1 ANO."
 

O guarda, já irritado com o rapaz que, ao invés de ajudá-lo na confecção do Boletim do Acidente, simplesmente abre um livro e começa a lê-lo, pergunta:
- E aí, vai responder agora ou quer que eu o leve algemado para a delegacia?
- Peraí, o senhor perguntou o que mesmo?
- Se você atropelou a vítima! - retrucou o irritado PM.
- Atropelei sim, MAS FOI POR QUERER, seu guarda. Põe aí, "FOI COM DOLO"! "FOI COM DOLO"!



*Rosivaldo Toscano Jr. é juiz de direito e membro da Associação Juízes para a Democracia - AJD

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