terça-feira, 4 de outubro de 2011

....área vip: privilégio para mim, ética para você...




A imprensa que se indigna com os privilégios é a mesma que incensa a área VIP





Não sou um admirador ferrenho do rock, mas embalado pela companhia estimulante dos amigos das redes sociais, acabei acompanhando os embalos de sábado à noite no sofá, assistindo ao Rock in Rio pela televisão dias seguidos.

Entre uma música e outra, e muitas tuitadas, pude acompanhar o incansável espetáculo das prestigiadas entrevistas da área VIP, mantida pela organização do evento.

As apresentadoras da TV incensavam o lugar: vamos pra lá que tem ar condicionado e canapés para todos.

Todos, no caso, é uma coleção de artistas e apresentadores da própria televisão que transmitia o evento –e sabe-se lá quantas autoridades.

Tudo bem, ao final, muitos comentaram o “dia de rock, bebê”, da Cristiane Torloni, ou a expansiva entrevista de Willian Bonner, a quem nos acostumamos a ver taciturno no Jornal Nacional.

Mas o desfile de subcelebridades que tinham pouco a dizer sobre o evento (além de explicar como deixaram seus filhos em casa num dia e o trouxeram em outro) marcou a transmissão com um quê de revista Caras –aquela que leva seus ricos e famosos para ilhas e castelos.

Afinal de contas, a exclusividade é tudo.

Para quem tanto incensa a área VIP, as pessoas “realmente importantes”, ou, no caso a si mesma, quando se dirige aos próprios atores, fica estranho o discurso moralista que se verá nas edições dos telejornais dos dias seguintes: o respeito à ética e aos postulados republicanos, a indignação com os privilégios, o apelo ao fim do patrimonialismo.

As relações de privilégios (leis privadas, em sua concepção etimológica, que servem a poucos) são altamente nocivas na esfera pública, rompendo a noção de igualdade que a lei deve assegurar.

Mas não nos enganemos: elas só existem no espaço público, porque são assim tão prestigiadas no privado.

A ânsia de levar vantagem, de ter exclusividade, de se diferenciar dos demais está na raiz dos privilégios que o poder distribui –com regras, cargos e verbas selecionadas a dedo a pessoas que sejam “realmente importantes”.

A corrupção é mais filha da desigualdade do que nossa vã filosofia faz supor.

Ou, como diria, Antoine de Saint-Exupéry: Você se torna responsável por tudo aquilo que cativas...
MARCELO SEMER

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